sexta-feira, 3 de junho de 2011

Sala 209

              Ela me inspirava, me inspirava alguma coisa parecida com medo. Passava a aula toda me encarando. Mesmo quando eu estava parada ela analisava meus movimentos. Eu conseguia ver tudo com o canto do olho e me mantinha aparentemente inconsciente, não queria alimentar o que quer que habitasse seu pensamento.
              Se por acaso eu passasse os olhos pela sala e esbarrasse em sua obscura figura a me observar, ela esquivava sua visão e inventava outra coisa para mirar.
              Me lembro de duas ou três vezes em que não conseguiu inventar nada. Então nossos olhares se cruzaram e permaneceram fixos, atracados como lutadores de judô sobre um tatame. Desconforto e cumplicidade levando a situação adiante. As duas pegas no flagra, ela em sua admiração silenciosa, eu em minha curiosidade, ambas desconcertadas.
              Vontade de sorrir, de gargalhar, virar o rosto e não acreditar naquilo. Esboço de inquietação no ar. Acabávamos inventando mais o que mirar. Os olhares se desconversavam.

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