segunda-feira, 22 de julho de 2013

Perdedora


- Com licença, moça, tem alguma coisa minha aí?
- O que você tá procurando?
- Algo que eu tenha perdido.
- Mas o que é exatamente?
- Ah, pra falar assim, de pronto, eu nem sei. Já perdi tantas coisas.

- Dá uma olhada nos RGs. Meu nome é Paula Campos de Oliveira.
- Ok. Só um momento.
- Obrigada.

- Olha, to vendo aqui. Não tem nenhum RG com o seu nome, senhora.
- Poxa vida! Perdi uns cinco só no ano passado.
- Mas a senhora perdeu todos aqui?
- Não, nenhum. Eu acho.
- Como assim, minha senhora?

- Desculpa, to aflita. Acho que vim atrás de outro tipo de suporte. Tem muita, muita coisa que eu não sei onde foi parar. Será que aqui vocês dão algum auxílio pra gente como eu?
- Auxílio, senhora?
- É, essa não é a central de achados e perdidos?
- É sim.
- Pois então, vocês têm que dar uma assistência pros desatentos crônicos. Se não fôssemos nós, sabe-se lá onde você estaria trabalhando.
- Olha senhora, primeiro que aqui é a central dos achados e perdidos responsável só pelos objetos encontrados nessa unidade. Depois, que nesse caso, provavelmente, eu estaria cumprindo meu horário em outro setor. Mas, francamente, não sei onde a senhora quer chegar com essa conversa.
- Quer dizer então que aqui só encontram e devolvem o que a gente perde?
- Basicamente, senhora. Nós também catalogamos e monitoramos as devoluções.
- Mas e as funções sociais desse orgão? Palestras informativas, diagnósticos de deficit de atenção e alzheimer, reuniões semanais dos distraídos anônimos?
- Isso é uma piada?
- De forma alguma, não é nem um pouco engraçado. Perdi por aí muita coisa necessária: carteiras, remédios, máquinas fotográficas, celulares, mochilas; várias mochilas, livros; autografados inclusive, já até desisti de comprar óculos escuros e relógios. Estou desesperada. Sofro com isso desde os paninhos sujos que as crianças normalmente carregam pra todo lado. Os meus nem duravam tempo suficiente pra sujar. Perdi três alianças seguidas, depois o namorado.
- Calma senhora, não chora, por favor.
- Já cheguei a achar que eu era simplesmente desapegada das coisas materiais, mas ninguém perde um molho de chaves por semana pra exercitar o desapego. Já pensei em procurar um médico, mas não sei onde está a carteirinha do convênio e nem celular eu tenho mais por causa disso tudo. Vocês são minha última esperança. Tenho pensado em coisas tão drásticas. Só faltava vir aqui antes de...


- Senhora, por favor, nem pense em fazer isso. É pecado mortal!


- ...antes de comprar uma pochete.

Um comentário:

  1. Gostei mto do texto, assunto sério, vc conseguiu dar um tom importante e tb ficou cômico.
    Dei boas risadas.
    Parabéns!!!!!Bjs.

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