terça-feira, 12 de outubro de 2010

Reencontro

Não era uma viagem longa, apenas dez ou quinze minutos, mas eu já tinha feito aquele percurso tantas vezes que ficava terrivelmente entediado, e lamentei não ter levado um livro para ler. Olhava para meu reflexo no vidro da janela, para os outros passageiros que entravam e saíam, para os túneis, e de repente quem vejo? Paula Moors. Ela estava sentada de frente para mim, cinco ou seis fileiras adiante, no memso vagão do metrô. Não sabia há quanto tempo estava ali, nem em que estação havia embarcado. Olhei seu rosto por um momento, o nariz agudo, a arcada proeminente (alguém me dissera que ela colocara aparelho). O cabelo estava mais comprido agora, mas, de resto, não havia mudado tanto, desde a época em que me dissera aquelas palavras terríveis: "Acho que não estou apaixonada por você." Que frase! Que escolha de palavras!
Durante seis meses, talvez um ano, já não lembro, senti sua falta com a aflição de uma dor de dente. Tínhamos cometido tantas intimidades no meio da noite, tinhamos dito tantas coisas secretas, e agora estávamos ali, nós dois, calados, no memso vagão do metrô. O que teria um sabor trágico quando eu era mais jovem - mas que agora precia, sei lá, um fato normal da vida. Nada fantástico, nem indecente, nem engraçado, apenas algo comum: o mistério de alguém entrando e saindo da nossa vida, afinal, desmistificado. (Essas pessoas acabam indo para algum lugar.)

Trecho do livro O Clube do Filme, de David Gilmour

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